TIRO LIVRE

Estrago pós-Levir Culpi

No melhor estilo "mãe Diná" do futebol, Tiro Livre praticamente antecipou a maldição que recairia sobre o Atlético a partir daquela decisão de Nepomuceno

postado em 21/07/2017 12:00 / atualizado em 21/07/2017 17:59

BRUNO CANTINI / ATLÉTICO

Encerrada ontem, a passagem do técnico Roger Machado pelo Atlético foi, de ponta a ponta, um déjà vu de Diego Aguirre. Da filosofia de jogo, de privilegiar a posse de bola, ao comportamento impassível do time em campo; da intenção da diretoria em fazer um trabalho a longo prazo (com ambos assinou contrato de dois anos) à quebra da promessa diante da pressão por causa da inoperância da equipe; da defesa ao trabalho do técnico por jornalistas que acompanham o dia a dia do clube à crescente insatisfação da torcida, cansada de ver um grupo com destaques individuais, porém desconectado coletivamente. Aguirre iniciou a temporada de 2016 no Galo. Participou da montagem do grupo e tudo. Despediu-se cinco meses depois. Roger iniciou a temporada de 2017. Participou da montagem do grupo e tudo. Despediu-se seis meses depois. No intervalo entre eles, Marcelo Oliveira, um treinador de estilo completamente diferente, de apostas ofensivas, que sobreviveu no cargo também por apenas seis meses. Cronológica e friamente falando, um ano e meio de vida desperdiçado na história do alvinegro.

Voltemos ao ponto de partida dessa bola de neve desgovernada em que se transformou o Atlético. Mais precisamente, ao dia 25 de novembro de 2015, quando, com lágrimas nos olhos, Levir Culpi se despediu do clube. “No fundo, no fundo, eu gostaria que vocês falassem: ‘Você é um cara legal’. Pronto. É isso! Até breve!”, disse, ao fechar, segundo ele, seu ciclo no Galo, após a quarta passagem. Visivelmente magoado, Levir deixou o Atlético com o título da Copa do Brasil (numa campanha fantástica, que contou viradas incríveis sobre Flamengo e Corinthians e vitória sobre o arquirrival Cruzeiro na final), além do troféu da Recopa Sul-Americana e do vice-campeonato brasileiro.

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Para muita gente, ali o presidente atleticano, Daniel Nepomuceno, dava uma das cartadas mais equivocadas de sua administração. Um apressadinho vai logo se manifestar, chamando a colunista de “engenheira de obra pronta”, dizendo que “falar agora, depois do leite derramado, é fácil”. Pois para quem pensa assim, segue um trecho da coluna Tiro Livre publicada dois dias depois da demissão de Levir. “Discordo de sua demissão – e não por te considerar um cara legal. É frustrante ver que bons trabalhos não garantem continuidade no Brasil. Mais: que títulos de expressão não asseguram um trabalho a longo prazo. Se você foi punido por ter sido vice-campeão brasileiro, há algo errado por aqui. A não ser que haja algum problema interno, alguma justificativa mais plausível que resultou na sua saída e que tenha sido abafada. O que não seria novidade, já que essa transparência que você carrega não é tão comum assim no futebol.” Essa justificativa plausível, que poderia ajudar a entender a dispensa de Levir, não veio.

E não é só. No melhor estilo “mãe Diná” do futebol, Tiro Livre praticamente antecipou a maldição que recairia sobre o Atlético a partir daquela decisão de Nepomuceno: “Quem não pode ficar sossegado agora, Levir, é seu substituto. Ele chegará sob a pressão de suceder dois dos treinadores mais vitoriosos da história atleticana, que deram ao clube alguns dos títulos de maior peso de seus 107 anos. Quem vier terá de fazer o mesmo tanto, ou mais, do que Cuca (campeão da Libertadores e bi do Mineiro) e o próprio Levir (além da Copa do Brasil, faturou a Recopa Sul-Americana e o Estadual). O grau de exigência da torcida aumentou e, na mesma proporção, a impaciência. Ser segundo colocado já não basta. Boa sorte a quem aceitar a missão!”.

Pois sorte não foi suficiente para quem assumiu a equipe depois, por mais que tenham sido formado grupos em condições de garantir pelo menos um título de expressão ao Atlético. E aqui não entra o Mineiro, que o alvinegro ganhou com atuações seguras somente a partir da semifinal, já que esteve longe de ser convincente durante a fase de classificação, por mais que houvesse, como álibi, o fato de Roger Machado estar iniciando o trabalho.

Ao abrir mão de Levir, de forma bem consciente, o presidente deixou claro que acreditava ser melhor uma mudança de rumos no Galo. Mas as escolhas foram erradas. De todas, a única que apostei que daria certo foi a de Marcelo, por acreditar que sua filosofia de futebol ia ao encontro da característica dos jogadores. Novamente, mais um treinador penalizado por ser vice-campeão. Sinal dos tempos no Atlético...

Hoje, acredito que o cenário é muito mais complicado que o de um ano atrás. O Atlético está à deriva às vésperas de uma semana decisiva, em que definirá seu destino na Copa do Brasil e, depois, na Copa Libertadores. Falta-lhe um diretor de futebol de peso, com ascendência sobre o grupo, formado em sua maioria por jogadores experientes e de personalidade forte. E essa equação (falta de um diretor de futebol influente + medalhões) exige a chegada de um técnico de envergadura nacional. Na contramão disso, todos os que estão à disposição no mercado serão apostas, tanto quanto Roger Machado. E o final desse filme a gente já conhece.

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