Copa do Mundo

CONEXÃO RÚSSIA

No Estádio Luzhniki, o capitalismo no calcanhar de Lênin

"Aos pés da imagem do líder comunista estará uma das fan shops"

postado em 03/06/2018 08:47 / atualizado em 15/06/2018 19:42

Renan Damasceno/Superesportes

Enviado especial a Moscou

A pujante estátua de Vladimir Lênin (foto) em frente ao estádio de Luzhniki, palco da abertura e final da Copa do Mundo, ganhou uma companhia inusitada com a chegada do Mundial. Aos pés da imagem do líder comunista, que guiou os bolcheviques na tomada de poder na Revolução de Outubro, em 1917, estará uma das fan shops – lojas que vendem, a preço de ouro, os artigos oficiais da Copa do Mundo. Lênin não deve estar feliz de ver sua imagem astuta ofuscada por uma logo da Visa. 

Em pouco mais de uma semana a Rússia recebe seu terceiro evento de primeira grandeza do esporte, com a expectativa que o tiro não saia, mais uma vez, pela culatra. O Complexo de Luzhniki – erguido na década de 1950, com o nome de Estádio Central Lênin –, foi palco dos Jogos Olímpicos de Moscou’1980, marcada pelo boicote norte-americano. Naquela edição, a União Soviética tentava mostrar ao mundo que ainda era uma potência econômica de 15 nações vivendo harmoniosamente, sob o governo conservador do ucraniano Leonid Brejnev. 

Mas o que se viu pouco depois da lágrima escorrer do rosto do ursinho Misha, foi bem diferente. Doente, Brejnev encerrou seu governo em 1982 com a economia estagnada. Revelou-se, nos anos aseguintes, um país em frangalhos. Em 1985, Mikhail Gorbachev deu início ao período de transição que culminaria com o fim do bloco, em 1991.

Na década de 1990, a Rússia passou por um forte processo de privatização, marcado por corrupção e ascenção de novos milionários – Moscou é, hoje, uma das cidades com maior número de milionários per capita do mundo. A cara dessa nova Rússia, de oligarcas do gás e petroleo, de homens que comandam clubes de futebol pelo mundo, foi o que país exibiu em 2013, nos Jogos Olímpicos de Inverno de Sóchi – cidade que será base da Seleção Brasileira, na divisa com a Geórgia, vizinha às conturbadas regiões da Ossétia e Chechênia.

Os Jogos de Sóchi, os mais caros da história, ficaram marcados mais tarde marcado pelos escândalos de doping sistêmico de atletas, com participação do estado, segundo a Agência Mundial Antidoping (Wada). O escândalo tirou 110 atletas russos dos Jogos do Rio’2016.

A Copa do Mundo, que começa dia 14, com Rússia e Arábia Saudita, no Luzhniki, custou quatro vezes mais que o Mundial passado, no Brasil (em torno de US$ 10,8 bilhões), sendo que 75% do dinheiro é estatal. No poder desde 1999, revezando o cargo máximo da nação com seu aliado Dmitri Medvedev, Vladimir Putin sabe do potencial do Mundial para suavizar a imagem do país no cenário internacional, arranhada pela polêmica anexação da Criméia e pelo apoio de Putin a Bashar al Assad na Guerra da Síria. Ao contrário de dentro das quatro linhas, que é relativamente fácil apontar os favoritos ao título da Copa, é impossível prever o que o Mundial pode impactar no xadrez geopolítico. Pelas edições anteriores, entretanto, já sabemos que evento em solo russo antecede momentos históricos.

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