Futebol Nacional

ENTREVISTA

Evandro Carvalho comenta Nordestão, Cotas e TCN: "Público presente é quem comprou ingresso"

Presidente da Federação Pernambucana de Futebol defendeu programa

postado em 29/09/2014 09:21 / atualizado em 29/09/2014 13:40

Cassio Zirpoli /Diario de Pernambuco , João de Andrade Neto /Superesportes

Ricardo Fernandes/DP/D.A Press
Bastaram pouco menos de três anos à frente da Federação Pernambucana de Futebol para que Evandro Barros de Carvalho se tornasse uma das figuras mais controversas do esporte local. Seja na organização do Estadual, na relação com os clubes ou mesmo em disputas jurídicas, o dirigente invariavelmente se viu em meio a confusões. Mesmo assim, foi eleito por aclamação para mais quatro anos como presidente da entidade. Na última quarta-feira, o dirigente recebeu a reportagem do Superesportes em seu escritório para uma entrevista de quase duas horas. Conversa franca, mas cheia de contestações. Na pauta, temas polêmicos como arbitragem, cotas de tevê, organização do próximo Estadual e, principalmente, os públicos fantasmas do programa Todos com a Nota.

Eleito por aclamação

O senhor esperava ser aclamado, mesmo após alguns desentendimentos com Sport e Náutico?
Cem por cento. As reclamações do Sport decorrem de arbitragens. Isso é tradição no Sport. Eu acho que a arbitragem local tem que apitar do primeiro ao último jogo do campeonato. Os erros são normais. Para o próximo Estadual vou propor aos clubes se a arbitragem será totalmente local ou se será importada nos clássicos. Particularmente, acho uma bobagem essa ideia ultrapassada dos clubes acharem que são roubados pela arbitragem. Tanto que propus a Marco Polo del Neto (presidente da Federação Paulista e futuro presidente da CBF) e ele aceitou que sempre que um clube de São Paulo viesse jogar no Recife teria arbitragem daqui e qualquer jogo de um clube nosso em São Paulo tivesse arbitragem de lá. Mas é impossível fazer isso com a mentalidade dos dirigentes de clubes atualmente. Já desistimos dessa ideia. Talvez leve 50 a 100 anos para convencer os dirigentes disso. Com relação ao Náutico, o problema foi de tabela. Quando assumi a federação tracei uma participação seletiva dos clube e abri mão da prerrogativa de fazer a tabela. Isso funcionou no primeiro ano e não funcionou no segundo. Agora a federação vai fazer a tabela e simplesmente dar conhecimento aos clubes.

O senhor era contra a reeleição. Até quando pretende ficar no comando da FPF?
Tecnicamente, essa não foi uma reeleição. Eleição é quando você se candidata para determinado cargo, e essa foi a primeira vez que me candidatei. O que houve foi um preenchimento de vacância do cargo (com a morte do ex-presidente Carlos Alberto Oliveira). Eu entendo que o correto é uma eleição e uma reeleição, inclusive para a CBF. Fui eleito pela primeira vez e pelo meu conceito poderia concorrer a uma reeleição (o que o deixaria 11 anos no cargo), o que não quer dizer que isso vai acontecer. Pode ser que por motivos pessoais eu não concorra. Há dirigentes que passam 30 anos. Carlos Alberto passou 16.

Todos com a Nota
Nando Chiappetta/DP/D.A Press

Em 2015 haverá uma maior fiscalização do programa Todos com a Nota para impedir os públicos “fantasmas” no Estadual, quando o anunciado no borderô não corresponde ao real presente aos estádio?
A fiscalização é da própria Secretaria da Fazenda. O governo só paga o que foi trocado. A lei é clara. Se forem trocados 10 mil ingressos, não importa se no estádio tem 10 mil ou uma pessoa.

Isso não desvirtua o programa?
O programa é exatamente por isso. Para fazer a troca.

Não se discute a troca, e sim a presença de público nos estádios.
Está no borderô, o total de ingressos adquiridos e total de ingressos do Todos com a Nota.

No borderô não aparece quantas pessoas de fato estiveram no jogo.
Como eu pago o INSS? A lei determina que eu sou obrigado a pagar em cima do valor recebido.

Mas já foi feito um questionamento à Secretaria da Fazenda e não teria problema de se colocar no borderô também o público presente.
Todos com a Nota é troca de ingressos. Todo jogo anunciamos o público.

Não anuncia. Na estatística de público da Série D, por exemplo, o Central tem pouco mais de 7 mil torcedores por jogo, quando os públicos reais não foram esses.
O que dá média de público não é quem está no estádio. É quem pagou, quem comprou ingresso. Eu tenho que recolher INSS.

Não seria mais fácil o Estado patrocinar o Estadual?
Perderia a essência do programa.

Mas o senhor não concorda que a essência do programa já está perdida, já que ela não é apenas ajudar os clubes do interior, mas principalmente levar o torcedor ao estádio?
O objetivo não é esse. O objetivo é gerar uma série de opções de lazer para a população mais pobre. Além disso, há a contrapartida do percentual do governo que vai para ajudar instituições de caridade, creches e hospitais que recebem em torno de 20% da receita do TCN. Se o governo faz patrocínio, acaba todo esse apoio social. O dinheiro vai direto para o clube, livre de imposto. Não gera nenhuma contrapartida social.

Se em todo jogo se anuncia o público real no estádio, qual a dificuldade de colocar isso também no borderô?
Público presente para critério técnico é quem comprou o ingresso.

Então para quê anunciar?
Para atender um pedido da imprensa.

Então aqui vai um novo pedido. Coloque isso no borderô.
Se eu colocar no borderô, o que vai ser computado para média de público e para os encargos será o público presente. E isso vai gerar uma sonegação fiscal. É crime. É o que a lei diz. Eu, inclusive, sou obrigado a recolher o seguro sobre público presente.

Inclusive uma seguradora está ganhando dinheiro para segurar gente que não está no estádio.
Sabe quanto a seguradora ganhava quando assumi? Recebia R$ 0,25 (por ingresso). Sabe quanto pago hoje? R$ 0,05. Como existe uma defasagem, eu fiz uma equação. Tanto que o valor do seguro é irrisório. Não existe seguro nenhum no mundo por esse valor. Exatamente para projetar efetivamente quem está em campo. Antigamente existia essa distorção. Antes ela segurava uma coisa que não tinha. Estava ganhando dinheiro que não precisava. Fiz uma equação. Eu tenho em média 2 mil ingressos trocados e em média 400 pessoas no estádio. O valor que era para 2 mil não podia ser o mesmo para 400. Então fizemos uma regra de três e esse valor caiu até chegar ao valor real de 400 pessoas.

Desde que houve a implantação do cartão eletrônico na capital, dificilmente aconteceu todas as reservas de ingressos por jogo.
Já estamos propondo o cartão magnético no interior. O problema é custo. Até o final de 2015 vamos implantar em todo o interior.

O senhor não acha no mínimo estranho um estádio estar vazio, como os dos sub-23, e no borderô constar 2 mil pessoas?
Vamos tomar por exemplo a Europa. Em Portugal os clubes vendem os ingressos antecipados por carnê e declaram para a Fazenda de Portugal todos os ingressos vendidos. A Fazenda recebe como público de 100% dos ingressos vendidos e alguns clubes no final do campeonato dão público zero, mas tudo já foi computado. Legalmente tem que ser assim. Se não for assim é sonegação, é crime. Não tem outra maneira.

Mas isso não é com dinheiro público
Mas a lei é a mesma.

Mas o dinheiro é público. Não seria mais justo pagar apenas pelos ingressos que de fato foram usados?
Aí perde o objetivo da Fazenda, que é o aumento da arrecadação de receita.

Isso não é uma forma de se burlar para ter uma maior receita?
Não tem como o governo fazer nada diferente. O governo é engessado. A única maneira é ele terminar o programa e resolver patrocinar os clubes. Se ele fizer isso, ele tira toda a contrapartida social. A gente já pensou nisso. Seria mais cômodo para a gente.

Em resumo: no ano que vem teremos públicos fantasmas de novo?
Qual o conceito de fantasmas de vocês? Em Goiás o governo paga antecipado e dá o direito do clube de apresentar no final do ano ‘x’ notas.

O senhor está justificando uma falha com outra.
Não é falha. É que não tem como fugir disso. Se eu lançar no borderô mil pessoas em campo estou sonegando o INSS, porque houve troca de 5 mil ingressos.

Mas na prática isso já está acontecendo. O senhor está apenas documentando para não ter o perigo de ter o problema.
Como gestor tenho que prestar contas com o INSS e o Tribunal de Contas. Ou é assim ou acaba. Não tem jeito.

Cotas de televisionamento   
Ricardo Fernandes/DP/D.A Press

Vamos mudar de assunto. O que a FPF pode fazer para melhorar a divisão das cotas de televisionamento dos clubes no Campeonato Brasileiro?
O modelo brasileiro é melhor que o modelo inglês (onde 50% da receita é dividida de forma igual entre os 20 clubes, 25% de acordo com a classificação do ano passado e 25% com a audiência). O modelo brasileiro paga mais do que isso. É mais igualitário que o deles.

O senhor está dizendo que a cota do Sport de R$ 27 milhões e do Flamengo de R$ 110 milhões é a mais justa?

É fácil de explicar. No Brasil, a Globo paga só 20% a mais entre Corinthians e Flamengo, que são os que recebem mais, com relação à Chapecoense, que é o clube que recebe menos, pelo canal aberto. O que justifica a maior diferença é o pay per view, que representa 80% do total da receita. Quanto mais pontos de audiência no PPV, mais os clubes tiram desse bolo. Tanto que os clubes querem, em dois ou três anos, acabar com a receita do canal aberto. O PPV é um modelo justo, que premia a audiência.

Como se faz o controle da audiência?
A TV tem uma ferramenta tecnológica para saber qual a audiência de cada jogo. Na hora que você compra o pacote todo e assiste todos os jogos, está contribuindo para todo mundo.

Pernambucano e Nordestão
Ricardo Fernandes/DP/D.A Press

Sobre o Campeonato Pernambucano de 2015. Qual será o formato?
Quando lancei o campeonato começando em dezembro, eu já sabia que haveria mudanças no calendário da CBF (com os estaduais começando em fevereiro). Por isso vamos cumprir o que manda a Lei Pelé e repetir a fórmula, começando em dezembro.

E o Santa Cruz, que está fora da Copa do Nordeste?
Como o Santa Cruz vai jogar até novembro, por conta da Série B, não poderá entrar no primeiro turno, que será um torneio com os clubes do interior valendo vaga na Série D. O Santa Cruz já entrará no segundo turno, que será a fase classificatória para a parte final do campeonato, onde entrarão Náutico, Sport e Salgueiro. Mas isso será decidido no arbitral.

O crescimento da Copa do Nordeste não tende a, cada vez mais, minimizar o Estadual?
O Nordestão fortalece o Estadual. Quem classifica para o Nordestão é o Estadual. Essa é uma condição sine qua non. Se não fizesse isso, o Estadual acabaria em dois anos.

O Santa Cruz reclama de não estar na Copa do Nordeste 2015 e usa como argumento uma reunião na FPF onde os clubes aprovaram a ideia de que o estado do time campeão ganharia uma vaga extra. O Santa tem amparo legal para essa reclamação?
A ideia era minha. Uma vaga seria do campeão e outra pelo ranking, com Piauí e Maranhão entrando com um representante cada. Os clubes aprovaram isso, mas depois que o Sport foi campeão, as federações da Bahia e do Ceará chamaram os outros estados para uma reunião, onde eles informaram que não queriam mais o que foi decidido. E na assembleia geral da CBF eles assinaram a ata. A reunião daqui não tem ata. Foi um acordo de boca. O pleito do Santa Cruz não tem embasamento jurídico.