Náutico

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Do olhar vidrado da janela, um acesso histórico para o Náutico e para Seu André

Em uma Home Care, o torcedor André Medeiros, de 52 anos, acompanhou a vitória sobre o Paysandu e emocionou outros alvirrubros

postado em 10/09/2019 18:00 / atualizado em 10/09/2019 23:24

<i>(Foto: Peu Ricardo/DP Foto)</i>
Entre as residências que a Rua Manuel de Carvalho, no bairro dos Aflitos, abriga, está a de um torcedor alvirrubro que mexeu com a emoção da torcida do Náutico para além do resultado do último domingo, que garantiu o acesso do time à Série B do Brasileiro, em 2020. Por cima de uma cama, André José Moreira Medeiros, de 52 anos, assistia ao Timbu vencer, na marca penal, o time do Paysandu. A cena foi tão emocionante, que mereceu ser congelada numa fotografia feita pelo filho, o engenheiro civil, Filipe Medeiros, de 26 anos. O registro, divulgado inicialmente no “story” do perfil de Filipe no aplicativo Instagram logo depois da torcida mandante ter invadido o campo, não demorou para viralizar nas redes sociais, ganhando repercussão e emocionando aos que partilham da mesma paixão em vermelho e branco.

A comunicação entre pai e filho acontece entre olhares e gestos. Isso porque, em março de 2015 André se envolveu em um incêndio numa lancha no mar da praia de Maria Farinha, em Paulista. Na época, o Corpo de Bombeiros que participou do resgate, suspeitou de falhas no tanque de combustível da embarcação. Além de André, outras cinco pessoas se queimaram. Todas com ferimentos de primeiro a terceiro grau. Consciente, ele foi levado ao Hospital da Restauração, onde após 20 dias internado, teve uma parada cardiorrespiratória e ficou mais seis meses e dez dias entre a UTI e o quarto comum do hospital. Ele sofreu uma sequela neurológica e perdeu os movimentos do corpo, inclusive a fala.
 
Desde então, Seu André, que mora com o filho e a nora, Camila Mesquita, se alimenta por uma sonda e divide espaço com cilindros de oxigênio e traqueostomia - processo que facilita a respiração. Há dez meses, ele ganhou mais um acessório: uma bomba de perfusão, por onde recebe medicamentos para alívio da rigidez da musculatura, diretamente na medula óssea. O seu dia a dia é compartilhado 24h com profissionais de enfermagem, e tem auxílio de fisioterapia e fonoaudiologia. Além disso, recebe semanalmente a visita de um médico para estimular o quadro clínico.
 
<i>(Foto: Filipe Medeiros)</i>
 

A história de amor com o Náutico vem logo em seu primeiro ano de vida. “Ele nasceu em 1968, então ele já nasceu num ano de glória para o Náutico (o hexacampeonato estadual). Mas, acredito que o ano de 2001, no Arruda, foi marcante para ele”, ressaltou o filho, recordando o título pernambucano no ano do centenário do clube. Na verdade, a paixão pelo Timbu vem passando de geração em geração na família. O pai de Seu André, Armando Medeiros ajudou na reforma do parque aquático do clube e com isso ganhou o título de sócio do clube, que vem passando de pai para filho.

Na vitória do acesso, contra o Paysandu, André assistiu ao primeiro tempo do jogo na sala do seu apartamento. No segundo, acompanhou o elenco em sua “arquibancada particular”, onde aconteceu o registro. Foi lá que viu seu time conquistar o acesso. No lugar de onde acompanha aos treinos e jogos.

Vidrado. Hipnotizado. Fascinado. Observador. Com essas palavras o filho retratou o sentimento no olhar do pai pela janela, na hora da batida dos lances penais. “O futebol é muito mais que só um esporte, é algo que vai de pai para filho. É muito mais interessante que só o jogo”, ressaltou Filipe, que acredita ter passado a mesma emoção que sentiu, aos olhos de quem acompanhou a emocionante cena por uma tela.

Pai e filho estiveram juntos pela última vez nas arquibancadas no mesmo cenário - e drama - que o duelo contra o Papão. Mas na ocasião, sem um final feliz para o Náutico. Era a Batalha dos Aflitos, em 2005, quando o time alvirrubro perdeu para o Grêmio, em jogo decisivo de acesso à Série A, com dois pênaltis perdidos e quatro jogadores expulsos.

“Meu pai curtia muito mais futebol até antes da Batalha dos Aflitos. Depois daquele jogo ele parou de acompanhar o Náutico. Tanto que foi o último jogo que eu acompanhei com ele.” Com o Náutico mandando seus jogos na Arena de Pernambuco, dificultou ainda mais a relação de André com o time. “Ele gosta mais de estádio raiz, nunca gostou de Arena”, comentou Filipe.

Assim, a volta aos Aflitos em dezembro do ano passado, foi um presente e tanto para André, já que ter a casa do seu time grudada à sua janela é um sonho longe da realidade para a maioria dos torcedores de um clube. Poder tratar o Eládio de Barros Carvalho como o “quintal de casa” é a “cereja do bolo” para Filipe. Nos jogos em que o Náutico vence nos Aflitos, a comemoração de amigos e familiares já tem destino certo: o apartamento de Seu André.
 
<i>(Foto: Peu Ricardo/DP Foto)</i>