EXEMPLO GERMÂNICO

Receita da renovação: Alemanha colhe resultados de medidas adotadas há uma década

Desde 2004, a Federação Alemã de Futebol (DFB) obriga os times da primeira e da segunda divisão a terem centros de excelência para jovens

postado em 10/07/2014 08:02 / atualizado em 10/07/2014 12:35

Guilherme Pera


 AFP PHOTO / PATRIK STOLLARZ


Ninguém planeja vencer o Brasil por 7 x 1. A derrota para os alemães nas semifinais da Copa do Mundo de 2014 foi a maior goleada sofrida pela Seleção em 100 anos de história. Por trás do massacre imposto na terça-feira, porém, tem muito trabalho. O atual poderio germânico nos gramados vem de um processo de renovação iniciado após a Eurocopa de 2000, na qual a Alemanha caiu na primeira fase. Diferentes iniciativas conduziram ao investimento em jogadores jovens e talentosos, como a trinca Özil, Götze e Müller.

Desde 2004, a Federação Alemã de Futebol (DFB) obriga os times da primeira e da segunda divisão a terem centros de excelência para jovens. O principal objetivo é revelar novos talentos na Alemanha. Com exceção do veterano centroavante Miroslav Klose, todos os jogadores que estiveram no massacre do Mineirão e passearam contra o Brasil foram treinados nesses lugares quando ainda eram aspirantes a profissionais.

Os clubes, aliás, não podem gastar mais do que ganham. A saúde financeira deles é alvo de atenção e, em caso de infrações, de punição por parte da Bundesliga e da Federação Alemã. Enquanto no Brasil, clubes como Flamengo e Vasco atolam em dívidas, atrasam salários e, ainda assim fazem novas contratações, Bayern de Munique, Borussia Dortmund, Schalke 04 e o resto da turma alemã têm de prestar contas e podem ser impedidos pela DFB de disputar o campeonato nacional. Há risco de rebaixamento de divisão se as contas não estiverem em dia.

São lições assim que o Brasil, país em que todos os grandes times têm dívidas, deve assimilar. Para isso, precisa de uma confederação que se preocupe com os clubes e com os talentos. O trabalho da DFB contrasta com a figura de José Maria Marin sentado nas confortáveis cadeiras de Wembley, em Londres, assistindo à partida entre Bayern de Munique e Borussia Dortmund na decisão da Liga dos Campeões da Europa em 2013. O dirigente estava alheio à abertura do Campeonato Brasileiro, principal competição da CBF, que ocorria no mesmo dia.

Público
O Brasileirão registra médias de público na casa de 15 mil pessoas, menor que a Major League Soccer (MLS), dos Estados Unidos, país que chama de futebol um esporte praticado com as mãos. A média da Bundesliga fica em torno de 45 mil, comparável à da Copa do Mundo. No caso do Borussia Dortmund, chega a 80 mil. Isso se deve, em grande parte, ao fato de os torcedores terem ações dos times (veja quadro).

Patrik Stollarz/AFP  - 14/9/13


O que faz a diferença

Centros de excelência dos clubes
A ideia vem do ano 2000, após a Alemanha cair na Eurocopa. A Federação Alemã (DFB) e a Bundesliga obrigaram todos os 36 times da primeira e segunda divisões a terem trabalho nas categorias de base. Isso impulsionaria a revelação de jovens talentos no país. Todos os jogadores da seleção alemã que está no Brasil, à exceção de Klose, passaram por esse projeto. Nos centros de excelência, a formação de atletas se dá pela exploração das partes técnica, física e tática, mas, principalmente, há investimento na personalidade do jogador. Há muito trabalho psicológico, principalmente nos clubes mais tradicionais. Uma empresa contratada pela DFB fiscaliza a atividade.

Exigências econômicas
A média alta de público da Bundesliga é um reflexo da boa organização do campeonato. Os clubes não podem vender 100% das suas ações, sendo que 51% delas ficam em poder dos torcedores. Isso faz com que haja muito interesse em ir aos estádios. Sem contar que as partidas são grandes eventos culturais, com preços baixos e carnês vendidos antecipadamente para toda a temporada. Os clubes não podem gastar mais do que ganham. Por isso, precisam comprovar saúde financeira para operar. Se um clube não apresentar garantias financeiras pra disputar a primeira divisão, por exemplo, ele é rebaixado.

Investimento da Federação
A Federação Alemã de Futebol, ligada ao governo, é dona de 366 centros futebolísticos. Desde 2001, meninos e meninas de 9 a 17 anos treinam em academias sem vínculos com clubes. A CBF, por sua vez, é uma associação privada e não desenvolve nenhum projeto para formação de talentos. A entidade apenas pega jovens que já jogam em times de aspirantes a profissional para atuar nas seleções de base.