TÊNIS DE MESA
Garimpando o amanhã: projeto social apresenta o tênis de mesa e descobre talentos do esporte
Futuro Campeão tênis de mesa como artifício para afastar crianças e adolescentes de más influências e descobrir talentos
postado em 21/12/2014 09:00 / atualizado em 20/12/2014 21:31
Aos 14 anos, Bruna Silva diz que tem o sonho de se tornar uma atleta. Tudo o que ela quer, hoje, é se divertir. Fala por falar, portanto. Sem ter noção, ao certo, do seu potencial, do futuro. Bruna é um diamante bruto. Talento puro. Energia de sobra. Há três anos, descobriu o tênis de mesa. Ou o tênis de mesa a descobriu por meio do professor Deivson Nascimento, que nem precisou ir muito longe. Encontraram-se na Vila Olímpica de Olinda. Ela praticava handebol, até que viu “uns meninos” jogando tênis de mesa.
Bruna é uma das descobertas do projeto Futuro Campeão, encabeçado por Deivson, que teve início em 2010 e até bem pouco tempo era realizado na Vila Olímpica de Olinda. Com o local em reformas, mudou-se para um colégio próximo, o Compositor Antônio Maria, em Rio Doce. As aulas de tênis de mesa são dadas numa das salas da escola, onde foram colocadas três mesas. Limitação de espaço que reduziu o número de atletas. Bruna continua. Nas segundas, quartas e sextas ela está lá. Como estuda no próprio local, vai em casa, almoça e volta.
Faltas
Apenas dois motivos fazem Bruna faltar a um dia de treino. Quando surge algum imprevisto e tem que cuidar das irmãs pequenas, Gabriela e Eduarda. A mãe, que trabalha como diarista, sai antes das 6h, volta para dar o almoço e sai logo em seguida. Retorna às 18h para servir o jantar, mas logo tem que sair novamente, para um terceiro turno de trabalho. O pai sai às 5h40 e volta às 20h.
O outro motivo é de saúde. Bruna sofre de asma alérgica. Quando tem crise, não tem outro jeito. “Vou para o hospital, nebulizar e tomar remédio, injeção”, diz, com naturalidade. Devido à doença, ela também faz natação. E ainda arruma tempo para as aulas de teatro e dança no colégio. “Vou participar do concurso de talentos”, conta, animada. Mas garante que nada supera o tênis de mesa na sua preferência. “Imagino me tornar uma atleta um dia. Quem não quer?”.
Só benefícios
Desde que intensificou as atividades esportivas, Bruna melhorou consideravelmente da asma. A mãe, Maria Lindalva da Silva, diz que há um bom tempo a filha não tem uma crise. Por isso, o incentivo ao esporte em casa é total. O irmão Leornado, 15, também treina. E uma das irmãs menores, Gabriela, de 7 anos, deve começar a pegar nas raquetes logo, logo. “Eu incentivo e sempre incentivei. Todos. Quando tem competição, se puder, vou com eles. O pai também”, afirma.
O tênis de mesa e a escola são dois alentos para dona Dalva. Sabe que, sem isso, as crianças estariam na rua. E o ambiente na comunidade onde a família mora, conhecida como Beco da Marinete, não ajuda. A poeira que vem da rua é a causa principal da asma alérgica de Bruna. Não é, porém, o maior dos problemas. A criminalidade é uma ameaça constante.
No dia em que o Superesportes visitou a Escola Compositor Antônio Maria, uma pessoa havia sido encontrada morta em um local bem próximo. O motivo mais provável: drogas. Mais do que afastar as crianças das influências negativas, o projeto Futuro Campeão, assim como outros tantos, ajuda a transformar o lugar onde eles vivem. São um reforço e tanto para dona Dalva. “Penso muito no futuro deles. O esporte junto com o estudo, pode garantir uma coisa melhor. Sou muito grata porque conto com a ajuda de muita gente. De Deivson, dos professores e da diretoria do colégio.”
Ídolo
Foi por conta de uma crise de asma que Bruna perdeu a oportunidade de ver pessoalmente o seu ídolo no tênis de mesa. Este ano, Hugo Hoyama veio ao Recife. Ela não pôde ir. Estava no hospital, tomando nebulização. “Queria muito ir vê-lo, lá no Sport. Mas não deu. Estava ‘cansada’”, lembra a menina.
Obstáculo comum aos projetos esportivos
Quando Deivson deu início ao projeto, em 2010, então com 19 anos, havia acabado de conhecer o tênis de mesa. Era como os meninos que treina hoje, um talento incipiente, descoberto pelo professor Ailton Silva, sargento da Aeronáutica e árbitro de nível 2 da modalidade. História que se passou em um projeto no bairro do Bongi. Começou como auxiliar, qualificou-se também como árbitro e, quando o mestre já não tinha mais como conduzir a iniciativa, assumiu o projeto, em 2011.
Aos 23 anos, Deivson conduz com paciência os cerca de 30 alunos do projeto. Atende a crianças, jovens e até mesmo adultos. Uma tarde no local e se percebe que não é nada fácil controlar o gênio impetuoso dos mais novos. Uma missão dupla. É preciso estimular os iniciantes e cobrar de quem já apresenta nível para ser considerados atletas e paratletas.
A maior dificuldade, no entanto, é manter a estrutura. Para isso, Deivson conta com doações de materiais para manter os garotos com equipamentos de qualidade. O dinheiro das inscrições nas competições ou vem do bolso do próprio Deivson ou de fora. Uma mesa nova, que ele comprou com dinheiro do próprio bolso recentemente, está prestes a ser trocada. Vai “virar” três mesas usadas. Nas atuais condições, quantidade fala mais alto que qualidade do material.