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Conheça a história do torcedor do Sport que salvou a vida de Lucas Lyra, baleado nos Aflitos

Destino colocou juiz Frederico Thompson no caminho do alvirrubro, que retornou para casa na última semana após ficar três anos e meio no hospital em recuperação

postado em 04/09/2016 14:44 / atualizado em 04/09/2016 15:10

Shilton Araújo/Esp.DP
O juiz Frederico Thompson não tinha a menor intenção de sair de casa na noite do dia 16 de fevereiro de 2013. Havia chegado em casa, no bairro da Tamarineira, após mais uma dia de trabalho no Fórum de Olinda. Não fosse a filha mais velha, Maria Eduarda, hoje com 23 anos e estudante de medicina, ter solicitado uma carona ao pai, até o bairro do Espinheiro, ele não teria deixado a residência.

De bermuda e chinelos, atendeu o pedido de Eduarda. O trajeto seria rápido. Uma blitze na Rui Barbosa, com direito a teste do bafômetro, atrasou um pouco a volta de Thompson, de 56 anos, para casa. Deixou a filha no destino e, novamente, outro pequeno imprevisto adiou por alguns minutos o retorno. Desta vez, um engarrafamento monstruoso na avenida Rosa e Silva. Era dia de jogo do Náutico.

E o magistrado não fazia ideia do que ia acontecer antes de chegar em casa. Para fugir do trânsito caótico, ele foi logo para faixa da esquerda. Queria o menor contato possível com o lado do estádio dos Aflitos. De repente, uma correria desordenada na Rosa e Silva. Gente para todo lado. De dentro do veículo, o torcedor do Sport acompanhava tudo. Era mero espectador de mais um tumulto em dia de jogos no Recife.

Não demorou muito para Thompson se ver personagem da tragédia que acabara de ocorrer nas proximidades do Eládio de Barros Carvalho. Era 16 de fevereiro de 2013. Dia fatídico para o estudante Lucas Lyra. Frederico Thompson foi quem prestou o primeiro socorro ao torcedor do Náutico, que voltou para casa na semana passada, depois de passar três anos e meio em leitos de hospitais.

"Fui parado por um guarda militar, que me acenava com a mão. Baixei o vidro e ele me pediu que prestasse socorro. Prontamente, atendi", conta o juiz. Apesar da confusão, corre-corre após o disparo que atingiu Lucas, seu irmão caçula Joel Lyra, teve receio de colocá-lo no banco do carro. "Ele sangrava muito. Estava coberto de sangue. Então, falei para o dono do carro que meu irmão estava completamente sujo de sangue", relembra Joel.

Nem passou pela cabeça de Thompson se preocupar com o bem material. Ordenou que colocassem o adolescente no banco do carro. Joel entrou no banco do carona. "Ele só me pedia para salvar o irmão. Estava muito assustado e falava para não deixá-lo morrer. Já Lucas sussurrava palavras desconexas e desfaleceu", explica Frederico, que também é engenheiro civil e escritor.

Em disparada, Thompson dirigiu até o hospital Agamenon Magalhães, o mais próximo de onde tinha ocorrido o incidente. "Meu maior medo era bater o carro nos cruzamentos da Rosa e Silva. Tinha um carro da polícia militar que abria o caminho com a sirene tocando. O meu carro não tinha sirene. Fiquei com medo de sofrer um acidente e não conseguir prestar o socorro. Consegui deixá-lo no hospital, onde uma equipe médica já o aguardava. Fui para casa. Joguei água no carro e tentei dormir", recorda.

Por semanas, a cena trágica povoou a mente do juiz. E para surpresa dele, após um tempo Joel o encontrou nas redes sociais. A princípio, o magistrado, hoje lotado na 2ª vara de títulos extrajudiciais no Fórum Joana Bezerra, preferiu não estreitar os laços com a família Lyra. Afinal, foi arrolado como testemunha no caso. "Não mantive muito contato com eles, pois não queria que houvesse maculação. Só mais na frente fui dispensado de testemunhar porque não tinha presenciado o fato. Fui apenas transportador. O motorista naquela noite", relata Frederico.


Os anos se passaram e Thompson manteve a discrição sobre o socorro prestado, mas não houve uma única noite que ele não orasse por Lucas. "Oro até hoje para que ele tenha uma vida melhor, apesar das limitações impostas pelo ocorrido. Não acompanhei o processo judicialmente, mas orava muito por ele. Venceu uma etapa gravíssima e agora está de volta em casa. Foi muito bom acompanhar pelos jornais o restabelecimento dele", declara.

Feliz com a retomada de Lucas Lyra, Thompson até cogita fazer uma visita. Mas não quer publicidade. E se oponho ao posto de grande salvador. "Não fiz nada demais. Apenas meu dever de cidadão. Sempre quis preservar a intimidade da família. Não estou em posição de herói. Não sei nem como vocês (a reportagem do Superesportes) me encontraram", comenta e sorri timidamente.